A VIDA É A ARTE DO ENCONTRO - 2
Na semana passada a newsletter teve esse mesmo título. Hoje volto ao assunto, que me é sempre muito caro, por conta de um encontro recentíssimo que despertou em mim o desejo de lhes contar umas histórias que são fruto justo desses encontros que a vida vai nos proporcionando. Eu, que sempre me esforcei pra ter olhos de ver e ouvidos de ouvir quando diante de encontros que prometiam ser épicos, guardo comigo os mais incríveis registros que mantêm vivos todos os personagens com quem cruzei ao longo de pouco mais de 52 anos de vida.
É que dia desses encontrei com o Moacyr Luz num evento na Cinelândia e fomos esticar no Amarelinho. Faço breve digressão.
Eu e o Moa nos conhecemos há quase 30 anos. Eu era um menino e faço desde já o adendo: um menino deslumbrado diante do que o mundo me apresentava. Minha relação com ele, que à época morava na Garibaldi, no mesmo prédio do Aldir, era como a de siameses. Nós nos víamos quase que todos os dias. Ou no Bar da Dona Maria, o legendário número 13 da Garibaldi, ou em sua casa, no térreo do 61 da mesma rua, ou na casa do Aldir, ou íamos ao Mistura Fina, na Lagoa (onde eu morei de 94 a 99), ou ao Bip Bip (foto abaixo)… enfim… zanzávamos juntos pela cidade, o que criou um elo entre nós que resiste até hoje a despeito de uns trancos, barrancos e barracos.
A foto abaixo tem Cláudio Jorge, Paulinho Figueiredo, Paulo Aragão, eu (garrafa na mão), Baiano, Dona Ivone Lara e o Moacyr escondendo o Luiz Carlos da Vila da fotografia.
Volto.
Uma amiga em comum, recente amiga de nós dois, disse espantada à certa altura:
— Nossa! Eu não sabia que vocês se conheciam!
E o Moa, de voleio:
— Se você soubesse o que nós já vivemos juntos… - e deu de rir depois de virar quase que num só gole o Martini à frente.
E é um pequeno passeio afetivo, pelas estradas que percorremos juntos, que quero fazer hoje. Até porque há histórias carregadas de muito amor.
Uma delas é essa, a que me arremessa a foto abaixo onde estamos Mello Menezes, Aldir Blanc, Moacyr e eu.
Estamos no final de 1997, Moacyr terminando de acertar os detalhes pra gravação de um novo disco - Mandingueiro.
Como já lhes disse, mais acima, vivíamos juntos, pra cima e pra baixo. Assisti, em posição privilegiada, quase que todas as canções sendo compostas. E o Moa sabia da minha adoração por aquilo tudo. Até que um dia, estávamos bebendo no Bar Lagoa, ele me disse que eu seria a voz guia durante a gravação do disco.
Janeiro de 1998 e eis o escrete no estúdio Hórus, na Lapa: Moacyr Luz no violão; cavaquinho, bandolim e violão tenor, Pedro Amorim; no 7 cordas, Carlinhos Sete Cordas; pandeiro, tamborim e ganzá, Beto Cazes; pandeiro, cuíca e tamborim, Ovídio Brito; surdo, Gordinho; tan-tan, repique de mão e tamborim, Marcelinho Moreira; e no coro, Paulão, Didu Nogueira, Beto Cazes e Ione Papas.
Foram quatro dias de gravação, da manhã à noite, Aldir presente num dos dias pra gravar sua participação numa das faixas. Uma festa, um estúdio transformado em botequim, uma generosidade do tamanho do mundo do Moacyr, que evidentemente me deu aquilo, aquela oportunidade, de presente.
O mesmo presente que foi o convite pra acompanhar o Aldir por ocasião de um dos festejos pelos seus 50 anos. Estamos em 1996. Marco Aurélio, seu grande amigo, de quem também tenho aguda saudade, seu sócio na gravadora ALMA (AL de Aldir, MA de Marco Aurélio), propôs a gravação de um CD por ocasião do cinqüentenário. Uma das condições foi a de que o Marco alugasse uma casa em Búzios pro Aldir passar um mês. E assim foi feito. Uma mansão na praia da Ferradura e pra lá fomos.
Um mês inteiro em Búzios num esquema frenético: um churrasco que durou 30 dias, caminhões entregando engradados de cerveja, momentos que nem duzentos anos apagarão da minha memória. Na foto abaixo, eu, Serjão e Moacyr.
Há poucos dias mandei essa foto, que achei nos meus arquivos, pro Moacyr. Segundos depois chega a mensagem:
“O que a gente tomou nesses últimos tempos? Veneno?”
Não bebemos veneno - bebemos da vida, intensamente.
E quero fechar por hoje fazendo uma confissão: eu, dissidente de mim mesmo - como me definiu Aldir - arrumei confusão com Moacyr algumas vezes ao longo desses quase 30 anos. Coisa besta, sempre, comum até em relações muito próximas e muito longevas.
Fato é que ficávamos sem nos falar, a assistência palpitava, punha lenha na fogueira, apareciam os bombeiros (uns com mangueira d´água e outros com gasolina), e sempre voltamos à normalidade.
Quando houve o último imbróglio, tive a idéia de convidá-lo pra participar de um episódio da série Botecos do Edu comigo (aqui, o canal). Pensei, entretanto: dessa vez ele não vai topar.
Topou de primeira.
Fomos buscá-lo de carro, na Glória, eu, Bruno Laet e Pedro Nicoll (que dirigiam a série) e Leo Boechat. Moa entrou na frente, sentou-se ao meu lado, puxamos um assunto besta ou outro, o gelo sendo quebrado, fomos ao Cantinho das Concertinas, no CADEG.
Filmagem rolando, nós bebendo, as histórias escorrendo na mesma velocidade com que descia o chope, o vinho, até que demos de chorar, os dois. À certa altura fomos pro balcão e ele me disse, entre bolinho de bacalhau, vinho tinto e muita emoção:
— Ninguém nunca vai entender o que a gente já fez!
Lembro-me do Laet, eufórico, me dizendo depois:
— Bicho! Que cena! Que momento que temos filmado! Vocês dois abraçados chorando no balcão, tá bonito demais!
Por ironia do destino - parece inacreditável - os caras perderam o HD que estava com todo o material bruto dessa tarde que terminou só à noite num pé-sujo aos pés do morro de Mangueira.
Leo Boechat e os dois meninos são testemunhas.
E meu coração, que jamais apagará aquele dia, também.
Voltarei, evidentemente, ao tema. O que os encontros nos proporcionam ao longo da vida deve ser tratado como o tesouro que eles são.
MARIA BETHÂNIA NA MANGUEIRA
Pra fechar, antes de lhes falar da parceria com a Noi, uma história que tem muito a dizer sobre essa nossa capacidade de ter olhos de ver, ouvidos de ouvir e sensibilidade pra compreensão do momento que vivemos.
O ano é 2016.
Estou no Sambódromo, numa frisa.
Comigo, Luiz Antonio Simas e Candinha - Morena na pista com crachá.
Começa o desfile da Mangueira.
De onde estamos apenas ouvimos a verde-e-rosa, ainda no setor 1, entrando na avenida.
Eu, debruçado na grade, os olhos voltados pro início da passarela, vejo de longe a Morena vindo correndo. Ela corre. Corre. Os braços acenando pra mim. Chego até a me preocupar. Candinha, mangueirense como a Morena (ainda não era, como é hoje, baiana da escola!), canta o samba a plenos pulmões. Até que a Morena chega. Rosto lavado, de tanto que chorava. Só grita:
— A Mangueira! A Mangueira! A Mangueira vai ser campeã! Bethânia tá fazendo ventar na avenida.
Simas, macumbeiro do setor 1 até a Apoteose, sorri.
Candinha chora junto.
Eu também me emociono com a emoção das duas.
Não acredito no que faz Maria Bethânia quando passa por nós - um carisma absurdo, uma potência sobrenatural, uma força indizível.
A Morena estava certa: a Mangueira sagrou-se campeã do Carnaval de 2016.
NOI
A partir de hoje, sábado, a newsletter tem parceria com a Noi, a mais carioca das cervejas - a despeito de ter nascido em Niterói.
Na semana passada fiz a confissão: eu e Simas usamos e abusamos do delivery da Noi durante o dificílimo ano de 2020 e em 2021 tive a graça de saber que quem armazena e gerencia a distribuição da Noi aqui no Rio é o Thiago, de quem lhes contei também aqui.
Pois a partir de agora você pode fazer seu pedido de delivery aqui e, na hora de fechar, usar seu cupom de desconto BUTECODOEDU
Usem e abusem que o chope e a cerveja são demais.
Até.
Podemos continuar o papo (e você pode saber mais sobre mim, nessa exposição permanente que são as ~redes sociais~) no Twitter | no Instagram | ou no YouTube
Dúvidas, sugestões, críticas? É só responder esse e-mail ou escrever para edugoldenberg@gmail.com
📩 Se você gostou do que viu aqui e ainda não assina a newsletter, inscreva-se no botão abaixo e receba por e-mail, uma vez por semana, sempre aos sábados, o Buteco do Edu. E se você achar que algum amigo ou alguma amiga pode se interessar pelo papo de botequim, encaminhe esse e-mail, essa newsletter, faça correr mundo esse balcão virtual.