edição especial número 20 - newsletter Buteco do Edu
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Nas últimas semanas, sem que eu tenha detectado o porquê do movimento, cresceram as assinaturas pagas (e, como ocorre com a imensa maioria delas, tendo gente que eu não faço a menor idéia de quem seja como assinante, uma satisfação).
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OS IDIOTAS DA OBJETIVIDADE
Não há ninguém que eu tenha lido mais, em pouco mais de 55 anos de vida, do que Nelson Rodrigues, o gênio absoluto. Lido. Relido. Lido de novo. E sempre, e permanentemente, tenho as mesmas reações, os mesmos frêmitos, os mesmos sustos e os mesmos assombros lendo o homem que melhor compreendeu a alma do brasileiro e que mais predições fez sobre nosso futuro (sombrio). Predições que se confirmaram com o tempo.
O livro que menos li, sem blague, li dez vezes - no barato.
Sou, como Nelson, ainda hoje (mais de 50 anos depois!), um indignado com a objetividade dos jornalistas - que deixaram, há muitos anos, por óbvio (ou não estaria aqui a lhes dizer isso), de imprimir à notícia a emoção sobre os fatos narrados e/ou descritos. Há tempos, e hoje mais do que nunca, a regra (estúpida) é a isenção.
E não há nada mais frio e mais horripilante e mais antijornalismo do que a isenção (aliada às regras do que se convencionou chamar politicamente correto, que meu querido e saudoso Aldir Blanc considerava o responsável pela míngua do humor).
Daí o que temos é o pastiche.
A falta de imaginação que é, na verdade, fruto de um comportamento típico de gente lobotomizada. Por isso, quem me acompanha sabe, as fórmulas burras que grassam na imprensa.
Um prédio pegou fogo? Incêndio atinge.
Saiu um bloco de carnaval? Bloco arrasta foliões.
Na praia? Há banhistas.
E os chefs dos restaurantes? Apostam.
Os exemplos são muitos.
A origem da tragédia passa por isso, pela retirada da alma das reportagens, das matérias jornalísticas, das coberturas.
O que sobra é a aridez. O antijornalismo, como lhes disse um pouco mais acima. O insosso. Os inconcebíveis manuais de redação.
Vejamos e vou me ater, aqui, ao jornal impresso (que quase ninguém mais lê, nem mesmo as versões digitais).
Todas as matérias se assemelham a bulas de remédio. São modorrentas. Cheias de uma técnica que não interessa ao leitor, humano, e portanto ávido pelas emoções que envolvem os fatos. Porque um homem sem emoção, meus poucos mas fiéis leitores, é o anti-homem.
Hoje há, e a coisa é endêmica, uma obsessão coletiva pelo que é considerado mais correto. Pela leveza. Pelo que chamam, os idiotas da objetividade, de lado bom da coisa. Há uma constante luta (inglória, digo desde já) para que nada doa, para que não haja dor, para que não haja sofrimento, para que seja tudo azul, para usar expressão jurássica que me veio agora à mente.
Vamos a (mais) exemplos corriqueiros.
Fulano descansou. Beltrano desencarnou. Sicrano faleceu. Não sei quem fez a passagem. Aquele foi morar no infinito. Aqueloutro passou para outro plano. Ou veio a óbito. Ou ainda virou estrelinha.
Qual a dificuldade de enterrar os pés no lodaçal do luto e dizer morreu?
Até quando esse otimismo instagramável que está a moer a estima da humanidade?
Onde estão as viúvas em fúria batendo cabeça no quartinho de velar o corpo do homem amado? Onde estão os viúvos inconformados, bêbados, chorando e babando sobre o corpo gelado de suas mulheres? Onde?!
A ditadura do sorriso, a ditadura da leveza, a ditadura yoga está nos destruindo.
Voltarei ao tema, evidentemente - porque ele é extenso, ele é urgente.
MANTO TUPINAMBÁ
Repetirei o que escrevi na semana passada porque a newsletter de semana passada foi exclusiva para assinantes pagos e muitos de vocês não leram.
Farei apenas um registro, aqui, para que fique de memória.
O ~manto tupinambá~, recepcionado semana passada pelo Governo do Brasil, estava há 300 anos na Dinamarca. Preservado como se tivesse sido feito na véspera pelos índios (que não podem mais ser chamados de índios).
Estamos em setembro de 2024.
Em janeiro de 2050 não haverá uma única pena inteira para contar história.
E acho que estou sendo otimista.
DAS PRATELEIRAS DO BUTECO DO EDU
Em 14 de fevereiro de 2017 publiquei O voluntarismo, no blog Buteco do Edu, aqui. Tem muito, muito!, a ver com o assunto tratado hoje, aqui, na newsletter. Ei-lo:
“Ontem eu almoçava com um queridíssimo amigo na Leiteria Mineira, uma espécie de refeitório de clínica geriátrica por conta da idade média dos freqüentadores e da ausência absoluta de sal na comida, deliciosa por sinal, e enquanto comíamos, ele foi de língua e eu de estrogonofe, conversávamos em tom de lamento sobre a mediocridade que assola o planeta de forma virulenta. Ele, que é de São Paulo e estava por aqui de passagem para arejar a cabeça – a expressão é sua – deu de se queixar do voluntarismo que grassa nas chamadas redes sociais, no Facebook precipuamente. Foi ele começar a falar pare que eu, excitadíssimo, com tudo concordasse. E ficamos, ali, divagando sobre o que temos visto, lido e ouvido, tendo sempre os voluntariosos como protagonistas.
Tentamos desenhar um esquema em busca de uma explicação para tanto voluntarismo e para esse fenômeno que dá ao idiota (apud Nelson Rodrigues) a dimensão de um gênio. Lembramos do reacionário, do genial dramaturgo, que em 1968 lançou a blague que hoje se verifica a olhos vistos:
“De repente, os idiotas descobriram que são em maior número. Sempre foram em maior número e não percebiam o óbvio ululante. E mais descobriram: — a vergonhosa inferioridade numérica dos ´melhores´. Para um ´gênio´, 800 mil, 1 milhão, 2 milhões, 3 milhões de cretinos. E, certo dia, um idiota resolveu testar o poder numérico: — trepou num caixote e fez um discurso. Logo se improvisou uma multidão. O orador teve a solidariedade fulminante dos outros idiotas. A multidão crescia como num pesadelo. Em quinze minutos, mugia, ali, uma massa de meio milhão.”
Eis que o Facebook é, definitivamente, o caixote azul no qual sobem, alguns várias vezes ao dia, diversos idiotas testando seu poder numérico. E um idiota curte o que o outro idiota escreveu. Um terceiro idiota toma coragem, vê-se refletido na tela diante de si, e ri – “kkkkk” – expressando sua concordância num relinche cibernético.
Um quarto idiota decide “fazer um vídeo ao vivo” – ferramenta que o caixote azul oferece – e começa (notem que quase sempre começa assim): “Oi, gente, eu resolvi fazer esse vídeo…”, e dá de falar as coisas mais sem importância, mostrar sua entediante rotina para uma platéia de idiotas, e a coisa vai tomando um vulto, uma proporção, num preocupante fenômeno que é efetivamente assustador.
Vai daí que esse coletivo de idiotas passa, então, a produzir uma massa de verdades absolutamente ridículas, pífias, que são replicadas, multiplicadas, encorajando outros idiotas pelo mundo afora e que passam, por conta dessa coragem que vão ganhando (lembrem-se, “em quinze minutos, mugia, ali, uma massa de meio milhão”), a patrulhar quem está quieto no seu canto.
Falamos, é claro, das mais recentes patrulhas que pululam por aí: não se pode mais falar a palavra “mulata” sem que alguém se aproxime com o insuportável ar de gênio trazendo debaixo do braço o argumento de que mulata remete à mula, que mulata é isso, que mulata é aquilo e outros bichos. Não se pode mais cantar determinadas marchinhas de carnaval sem que alguém quique diante de você apontando o dedo na sua cara: essa é machista, essa é homofóbica, essa é sexista, essa estimula a violência, essa é assim, essa é assado e outros bichos. A mais recente onda de voluntarismo chegou pra dizer quem pode e quem não pode usar turbante. Haja, haja, haja!
Está muito difícil – e vai piorar.
Volto ao tema em brevíssimo.
Até.”
LIVROS (A HORA DA JABALÂNDIA)
Publiquei poucas coisas até hoje.
Mas publiquei.
Meu lar é o botequim, que está esgotado, foi o primeiro (mentira, tenho vergonha do primeiro e por isso eu o omito). Pode ser comprado só em sebos (aqui) - tenho apenas um exemplar novo em folha e que estou aqui pensando como posso sortear.
De hoje não passa, escrito a quatro mãos (uma troca de cartas) com Julio Bernardo (aqui).
E Tijucanismos, aqui.
Uma ou outra coletânea… e olhe lá.
UMA DICA DE PLAYLIST
Quero indicar a vocês, meus poucos mas fiéis leitores, uma das playlists que montei no Spotify - Rio de Janeiro - que já conta com 175 seguidores.
Ela será permanentemente incrementada (e eu aceito sugestões que podem ser enviadas por e-mail!).
Ela está aqui ou, se preferir, ouça já! - abaixo.
A referida playlist deve ser ouvida no modo aleatório e, repito, está longe de estar definitivamente pronta. Assim como eu.
Até.
Podemos continuar o papo (e você pode saber mais sobre mim, nessa exposição permanente que são as ~redes sociais~) no Twitter | no Instagram | ou no YouTube
Dúvidas, sugestões, críticas? É só responder esse e-mail ou escrever para edugoldenberg@gmail.com
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