O texto da newsletter de semana passada foi “A vida em looping”, que pode ser lido aqui. Contei sobre minhas histórias com Zico, sobre como fui introduzindo Leonel, aos poucos (ele tem pouco mais de 4 anos!), no mundo do futebol e do Flamengo, sobre o dia em que ele me pediu pra conhecer o Galinho de Quintino… enfim, sobre esse fascínio que é apresentar ao meu único filho as paixões que permearam e que me permeiam a minha vida.
E contei sobre a conversa que tivemos, eu e Leonel, na semana retrasada, quando estive com ele na sede do Flamengo.
“— Quem é esse, papai? - estávamos diante da estátua do Zico.
Já soluçando, Leonel no meu colo, eu disse:
— É o Zico, filho.
— Nosso rei! - gritou um torcedor que assistia à cena.
— E por que você tá chorando, papai?
Tentei explicar a ele. Eu disse que, com sua idade, aquele homem havia me pegado no colo. Que era um craque. Que fazia muitos gols. Que meu deu muitas alegrias. E ele com o olhar alternando a figura do pai e a figura do Zico.
— Ele existe de verdade?
— Arrã.
— Quero conhecer ele, papai! - e apontando em direção à loja do clube saiu correndo.”
No dia seguinte liguei pra uma colega de trabalho - Talita Galhardo, a quem homenageio aqui de novo por conta da presteza e da gentileza, ela que terá pra sempre minha gratidão - e estava marcado o encontro de Leonel com Zico.
Leonel passou a semana ansioso.
Eu também.
Ansioso porque queria (re)viver as emoções diante do meu maior ídolo. Ansioso porque estava, afinal de contas, cuidando da fundação dos pilares da paixão pelo Flamengo no coração do meu filho - e eu sou um sujeito que, às favas à modéstia, cuido bem das coisas do coração, sei cultivar paixões e amores, e confiava (com ligeiro medo) que faria isso com Leonel sem chance de erro.
Pequena pausa.
Bem recentemente um amigo, travado, me disse (o nome não importa):
— Tô com 32 anos, Edu. E só hoje consegui dizer pro meu pai que eu o amo. E graças ao convívio com você.
Vejam se não é motivo de orgulho (e, nesse caso, a coisa ganha contornos ainda mais emocionantes e trágicos porque o pai, que estava internado quando da confissão inédita feita pelo filho, morreu poucas semanas depois). O sujeito me disse, na seqüência, que ficou tocado diante das minhas constantes e seguidas declarações de amor lato sensu. Tem hora que vale a pena, mesmo, ser hiperbólico no assunto. E quando o assunto é amor, é paixão, eu não deixo pra depois. A hora é sempre agora.
Voltemos.
A semana passou arrastada.
Mas eis que a quarta-feira chegou.
O ENCONTRO
Leonel acordou cedo na quarta-feira - sabia que iria conhecer o Zico.
Chegamos ao CFZ (Centro de Futebol Zico) pouco antes das três da tarde - hora marcada pela Talita pro encontro acontecer.
Eu não conhecia o CFZ e fiquei estupefato com o tamanho do troço: um empreendimento à altura do Zico.
Estava acontecendo a Copa Zico e centenas de crianças estavam no pedaço - Leonel atônito:
— Todo mundo veio conhecer o Zico?
Ficamos ali, na recepção, entre fotos, troféus, quadros, faixas, e percebi que Leonel - ainda sem saber lidar com as emoções - estava excitadíssimo e com a timidez turbinada.
Passava um pouco das três da tarde quando comecei a ouvir o alarido das crianças em êxtase gritando o nome do Zico.
Os olhinhos do Leonel brilhavam ouvindo aquele côro, ele me pediu colo, estava um pouco assustado com a quantidade de gente que cercava o ídolo rubro-negro.
Zico cumprimentou Talita, subimos todos pro segundo andar - pra uma espécie de gabinete.
E ali deu-se a mágica.
O ARREMESSO AO PASSADO
Eu precisava ser forte, segurar a emoção e não chorar - afinal de contas Leonel contava comigo. Não que eu não possa chorar diante dele - faço isso com freqüência, ele já sabe que o pai se emociona fácil. Mas eu precisava ser firme pra cuidar da emoção do pequeno. E fui.
No meu colo (a foto abaixo não me deixa mentir), Leonel não tirava os olhinhos (vidrados!) do Zico.
Uma confissão: passei a semana toda pensando no que é que Leonel construía em sua cabecinha no compasso da espera do encontro.
Ele sabia que ia ver o Zico. Que o Zico era o nosso rei. Que o Zico havia carregado seu pai no colo. As perguntas saltaram durante os sete dias: a gente vai ao castelo dele? Quem é a rainha? Ele vai te pegar no colo de novo? Ele vai me pegar no colo? Eu mostrava fotos e vídeos do Zico jogando. Ele é assim? Não, filho. Ele tá mais velho. Velhinho? Mais ou menos. Igual ao vovô? Não, menos. O cabelo tá branco? Ele usa coroa?
Quais as fantasias que embalaram os sonhos do guri? Quais as expectativas que o coraçãozinho do meu pequeno criou?
Zico autografou a camisa do Leonel - e ele acompanhando os movimentos da caneta. Não sabia, meu maragatinho, que ele era eu naquele momento. Que eu chorava por dentro. Que eu tinha de novo 5 anos de idade e que meus ouvidos ouviam os gritos vindos das arquibancadas lotadas naquele dezembro de 1974.
Pude contar ao Zico, de novo (já havia feito isso quando estive com ele em 2018), sobre o que aconteceu em 1974 - e eu não tenho, torno a fazer a confissão, nenhuma lembrança daquele dia.
O Galo riu, achou graça, fazia festinha em Leonel que, por sua vez, não desgrudava os olhos do ídolo sem dar uma só palavra.
Zico ainda pegou uma fotografia sua e a assinou, dedicando-a ao Leonel - e só então ele disse:
— O que o Zico escreveu, papai?
Eu li, a voz embargada, Zico me deu um abraço.
Era hora de nos despedirmos.
Tô com 53 anos.
E ainda me impressiona, mesmo!, a força dessa paixão, o tamanho e a magnitude de um ídolo que atravessa gerações. A quantidade de crianças que nem sonhavam em nascer enquanto Zico jogava e que ali estavam atônitas diante do ídolo, diz tudo.
Mas a tarde me reservava mais surpresas.
A PRIMEIRA ARQUIBANCADA
Estávamos tomando a direção do carro pra voltarmos pra casa.
Leonel não largava a foto autografada por nada.
Ele sabia, do jeitinho dele, que aquilo era um tesouro pra ser guardado com carinho.
Em um dos campos, assim que saímos da recepção, um jogo da Copa Zico.
Ele gritou:
— Vamos lá ver, papai!
E apontou pras arquibancadas.
— Vamos lá! Quero ver de lá.
Foi a primeira vez, acredito, que ele ouviu a palavra arquibancada.
— Vamos, filho. Vamos pra arquibancada. - já não havia o Zico diante de nós.
Fui chorando.
Sentei-me atrás dele (combinamos assim) pra não perder um só movimento.
Os olhos seguindo a bola.
Torcendo - escolheu logo um time pra torcer.
E eu irrigando o cimento concreto da arquibancada que há de ser, pra ele, o que foi pra mim.
Fim de jogo e ele mesmo disse:
— Vamos pra casa, papai? Tô cansado.
Eu quase morrendo.
A caminho do carro, no meu colo, dormiu.
O SONHO
Durante quase todo o trajeto, pela Linha Amarela, chorei o que não chorei diante do meu ídolo maior.
Até que chegamos em casa, quase uma hora depois.
Ele acorda.
Sorri, antes de vir pro meu colo.
E diz:
— Papai! Sonhei com o Zico.
NOI
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