CARNAVAL 2022 EM ABRIL
2020 foi o ano mais atípico que já vivemos todos. Janeiro, fevereiro, o Carnaval, veio março e com ele a pandemia, o medo, o desconhecido, o isolamento, um assombro por conta das mortes que varreram o mundo inteiro e nosso desespero particular por conta de um sujeito completamente desequilibrado à frente da Presidência da República que levou o caos aos quatro cantos do país.
Veio 2021 e com ele a esperança de que a coisa fosse arrefecer. Não aconteceu. Foi mais um ano de incertezas, de medo, de muitas perdas, um ano sem Carnaval, mais um ano de isolamento mas também um ano em que as vacinas chegaram até nós permitindo que sonhássemos com o que 2022 tornou real: a vida de volta.
Hoje, Sábado de Aleluia, véspera da Páscoa, estamos a 4 dias do início do maior espetáculo da Terra.
E na sexta-feira, dia 22 de abril, véspera do dia de São Jorge, terão início os desfiles das escolas de samba do Grupo Especial. Dia em que desfila o G.R.E.S. Acadêmicos do Salgueiro. Pra mim, particularmente, vai ser o marco definitivo do fim desses tempos tão sombrios.
SALGUEIRO
E vou lhes contar o porquê disso para que tudo faça sentido e não soe como delírio ou exagero. Não me importa exatamente, nesse específico caso, a precisão dos dados ou dos fatos. O que importa é que eu sempre soube que mamãe, quando menina, morando na Rua dos Araújos, na Tijuca, evidentemente, teve uma babá, negra, que desfilava na ala das baianas da Acadêmicos do Salgueiro. Tem, ainda hoje, minha mãe, memórias vivíssimas da tal babá.
Eu, quando menino, morando na Rua São Francisco Xavier, na Tijuca, evidentemente, lembro-me, com a mesmíssima nitidez com que minha mãe lembra da negra baiana, de assistir pela TV aos longos desfiles das escolas de samba, sempre ao lado de minha mãe, e lembro-me de vê-la sempre chorando, emocionada, quando a vermelho e branco pisava a passarela. Lembro-me, mais nitidamente ainda – sinto as mesmas dores agora – de suas unhas cravadas na palma da minha mão, soluçando, comovidíssima com aquilo tudo. Talvez visse, na telinha da TV, sua babá. Talvez fosse uma quimera e a negra já estivesse morta, talvez fosse saudade, não sei, nunca perguntei nada. Eu atribuía tudo ao amor pela escola.
Vai daí que eu tornei-me salgueirense.
Há, meus poucos mas fiéis leitores, um troço inexplicável que me diz sempre: quando eu morrer levarei comigo, dentro do meu coração, o Salgueiro.
Durante muitos anos vivi uma espécie de ritual. Um pouco triste com a transformação das escolas de samba, um tanto decepcionado com a quantidade de neon nas quadras, deixei de ir, com a regularidade com que sempre fui, aos ensaios do Salgueiro. Típico caso de paixão sem cura: não quero vê-la modificada, eu a amo mesmo assim, mesmo à distância, esses papos. Mas uma vez por ano, no mínimo, eu ia. Ia e me comovia brutalmente. Ia e chorava. Ia e me lembrava das unhas de minha mãe cravadas nas minhas mãos.
Quando o Salgueiro pisar a avenida nesse 2022 eu vou ter, de novo, calças curtas, camisa listrada, pouquíssimos anos, e chorar de saudade – sabe-se lá – da babá de minha mãe.
A VIDA VAI MELHORAR
A Unidos de Vila Isabel fecha os desfiles com seu enredo (comovente!) sobre Martinho da Vila. Tem, em seu refrão, a frase que está engasgada na garganta de todos nós que não perdemos a fé ao longo desses muitos meses de martírio: “(…) deixa a tristeza pra lá, canta forte, minha Vila, a vida vai melhorar, eu disse que vai melhorar, a vida vai melhorar!”.
Tô apostando minhas fichas que a Marquês de Sapucaí vai ver muito mais que duas noites de desfile. A avenida vai ser palco não apenas do maior espetáculo da Terra, mas também de uma catarse coletiva como a que o Rio de Janeiro viu em 1919, há 103 anos.
Pra encerrar, uma dica.
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Se liguem na resenha:
“Cidades têm as suas mitologias. Têm o seu Olimpo e o seu Hades, o seu rol de deuses e demônios, os seus picos e os seus abismos, as suas histórias exemplares e os seus vexames, as suas zonas de indecisão entre fato e lenda. No acervo mitológico do Rio de Janeiro, o Carnaval de 1919 ocupa uma dessas zonas.
Foi o primeiro carnaval depois do fim da Grande Guerra. Foi também o primeiro carnaval depois da voragem da Gripe Espanhola, a mais avassaladora pandemia a abater a cidade até então. Entre setembro e dezembro de 1918, a doença, inicialmente desprezada, infectou 600 mil pessoas e matou 15 mil — números aproximados, talvez subestimados, num universo de cerca de um milhão de habitantes.
Foi um carnaval que, por décadas, povoou as memórias próprias e emprestadas de cronistas como Nelson Rodrigues, Mário Filho, Austregésilo de Athayde, Vina Centi e Carlos Heitor Cony – que nasceu em 1926. Foi um carnaval que passou à posteridade como de liberação e de alívio, de desejo e de vingança. Foi um carnaval puxado por pessoas que haviam visto a morte de perto: se não por terem dela escapado elas mesmas, por terem presenciado, no mínimo, a agonia de amigos e parentes. No auge, na Terça-Feira Gorda, o Carnaval de 1919 levou cerca de 400 mil pessoas ao Centro do Rio de Janeiro, de acordo com a estimativa um tanto livre do jornal A Noite.
O que aquelas testemunhas e aqueles sobreviventes fizeram nas ruas – naquele e noutros dias? O que elas e eles imaginaram durante e depois da folia?
Com uma pesquisa cuidadosa e inédita, David Butter reconstrói essa história em detalhes. Não há momento mais oportuno do que este 2022 para relembrarmos aqueles dias, feitos de sonho e de desgraça, de tristeza e de esperança.”
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NOI
A newsletter segue com a parceria com a Noi, a mais carioca das cervejas - a despeito de ter nascido em Niterói.
Já lhes fiz a confissão e a repito: eu e Simas usamos e abusamos do delivery da Noi durante o dificílimo ano de 2020 e em 2021 tive a graça de saber que quem armazena e gerencia a distribuição da Noi aqui no Rio é o Thiago, meu irmão, irmão do meu irmão, de quem já lhes contei também aqui.
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Usem e abusem que o desconto é de 10% e o chope e a cerveja são demais.
Pra quem vai ficar em casa assistindo aos desfiles, uma tremenda pedida.
Até.
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